O objetivo do texto de hoje é tentar explicar de forma descomplicada o ambiente de investimentos mundial no contexto da alta de juros do FED, o Banco Central americano. Quero tentar ser didático porque algumas vezes o noticiário econômico é demasiadamente complexo, quando na verdade os conceitos são simples.
Finalmente o FED sobe juros de forma mais expressiva (3 altas consecutivas de 0,75%) seguido de uma retórica forte de novas altas a seguir.
Você que acompanha o noticiário de investimentos vê desde a última alta de juros do FED (Banco Central americano) uma grande dor de barriga se desenvolvendo no mercado. O que se lê em toda parte é a tal implosão do “mercado de títulos de renda fixa” nos EUA, UK e Europa.
Mas o que vem a ser essa crise e a tal implosão?
Vamos lá, do começo. Para se financiar, governos emitem títulos de dívida soberanas, os tais papéis do tesouro, que remuneram um percentual pactuado para diversos prazos. Aqui no Brasil se popularizaram com o Tesouro Direto, mas o mundo olha mesmo é para a dívida emitida pelos EUA, considerados “livres de risco”, são do chamados “Bonds”. Toda vez que você ler “Bond” entenda como uma dívida do Tesouro dos EUA.
São investimentos em Renda Fixa considerados conservadores e seguros, mas… O que acontece quando chega a inflação e os BCs são obrigados a subir os juros?
Desde 2008 (última grande crise financeira) os BCs ao redor do planeta jogaram as taxas de juros no chão. Alguns países brincaram de juros negativos (sim, uma brincadeira de péssimo gosto) que puniam o esforço poupador, cobrando dos poupadores para que o dinheiro ficasse parado no banco.
Investidores institucionais (seguradoras, fundos de pensão, e etc) não tem muito para onde correr, são obrigados (por lei), para cumprir com seus mandatos regulatórios a se entupir de títulos de dívidas soberanas consideradas seguras. Via de regra, quanto maior o prazo acordado, melhor é o negócio.
Indo direto ao ponto, imagine que você se entupiu de títulos da dívida americana rendendo 1,5% durante 30 anos… E agora novas dívidas estão rendendo mais de 3% ao ano. Quanto valem aqueles papéis que você comprou rendendo 1,5%?
Pois é, valem muito pouco. Adicione uma inflação oficial de 8,5% ao ano e veja o resultado prático… Você tem um papel que vence daqui a 30 anos, rendendo 1,5% ao ano, numa inflação oficial de 8,5% e para se livrar dessa bomba você tem que entregar esse título com um deságio gigante sobre o valor de face, ou seja, tem que perder dinheiro.
O mercado de juros opera a chamada “curva de juros”, que nada mais é que a expectativa de quanto serão as taxas do Banco Central para diferentes vencimentos (2, 5, 10 e 30 anos tipicamente), e é aí que a coisa fica mais feia. Como a inflação ao redor do planeta tem se mostrado muito resiliente, a expectativa é que os juros continuem a subir, ou seja, mais porrada no mercado de Bonds.
A cada fala de um banqueiro central, a tal curva de juros reprecifica para cima, ou seja, o mercado acredita que os juros irão subir ainda mais, o que penaliza até mesmo os recentes papeis comprados como sendo bons negócios a 3% ao ano.
Globalmente, o FED espirra, o resto do mundo tem um pneumonia…
Junto com a implosão do valor de título “antigos” surge o grande interesse nos títulos “novos”… Afinal, empreender e me lascar para ganhar 6% ou deixar o dinheiro parado e ganhar 4% sem “fazer nada”?
E assim estamos vendo uma enxurrada de dinheiro saindo de bolsas aos redor do planeta e de mercados emergentes para esses novos Bonds que estão pagando juros, que aos olhos de muitos gestores, justificam tal movimento.
Nesse cenário, vimos aproximadamente 30 TRILHÕES de dólares evaporarem dos mercados desde seu pico em 2021. Colocando em perspectiva, é aproximadamente 30% do PIB mundial.
FED Pivot
Muita gente aposta que a alta de juros vai ser um voo de galinha e que o FED vai ser obrigado a dar marcha ré.
Uma quebradeira generalizada poderá acontecer se os juros subirem demasiadamente, basicamente por dois motivos.
O primeiro é que muitas empresas não conseguiram lucrar o suficiente para pagar suas dívidas. Com juros perto de zero já eram chamadas de empresas Zumbi aquelas que male-mal conseguiam pagar a parcela das dívidas mensais. Agora com juros elevados, elas irão para debaixo da água.
O segundo é que juros elevados puxam o freio de mão das economias. Muita gente não conseguirá mais, por exemplo, financiar a compra de uma casa, pois com os juros elevados o valor da parcela não fica dentro do limite que os bancos acham aceitáveis para o endividamento.
Por outra lado, os EUA estão com pleno emprego, há mais vagas abertas do que pessoas buscando empregos e lembrem-se… Os juros reais ainda são fortemente (e convenientemente) negativos. Com inflação oficial de 8% e juros de 3,75% (e inflação real em mais de dois dígitos) o FED se coloca numa posição bastante confortável.
Ao subir juros ele joga para a torcida como quem está lutando bravamente contra a inflação e na prática dá risada com juros negativos corroendo sua dívida. Na humilde opinião do redator que vos escreve, o tal FED Pivot só acontecerá quando de fato os juros reais se aproximarem de zero, e até lá tem muito chão pela frente.
Na Prática
Na prática o USD globalmente se fortalece. Vimos moedas de nações desenvolvidas (Inglaterra e Japão por exemplo) negociarem como shitcoins de cachorrinho.
A um dia poderosa Libra Esterlina derreteu com a aprovação de um pacote de corte de impostos para “aliviar os efeitos da inflação”. Num raro momento dos últimos anos em que finalmente se pune quem faz besteira, a libra foi penalizada.
O BoE (Banco Central Inglês) subiu o juro numa ponta e o populismo barato da câmara dos lordes tirou arrecadação de outro, o resultado foi o USD massacrando a Libra.
O mundo que de 2008 até 2021 viveu uma corrida para ver quem baixava mais as taxas de juros vai experimentar uma corrida para ver quem sobe mais e mais rápido as taxas de juros…
O engraçado é que esse enfraquecimento das moedas vai trazer ainda mais inflação para o cenário.
Nesse ponto, o Brasil se antecipou e com seus obscenos 13.75% ao ano teve o Real praticamente estabilizado em 2022, a um custo que a partir de 2023 se tornará evidente, mas esse não é o tema de hoje.
1 BTC = 1 BTC
Que a profissão de jornalista já teve dias mais áureos é notório e sabido por todos, mas por vezes somos expostos à cúmulos do ridículo como a matéria de hoje (26/09/2022) do Valor Econômico.
O cidadão não estuda a pauta, não faz a lição de casa e fala asneira. O bordão 1 BTC = 1 BTC se refere ao fato de que ao contrário das moedas estatais, não haverá impressão de dinheiro descontrolada e inflação conveniente decretada por banqueiro central.
Serão 21 milhões de Bitcoin e fim.
Você jamais poderá afirmar que 1 USD = 1 USD ou que 1 Libra Esterlina = 1 Libra Esterlina, porque as impressoras estão na mão dos burocratas virtuosos.
Se hoje temos o caos instalado nas economias, lembrem-se que esse caos tem pai e mãe, ele é filho da cruza de Banqueiros Centrais e suas impressoras de dinheiro com o populismo imediatista da classe política.
Lembre-que que há exatamente um ano atrás era consenso de que a “inflação era transitória” e de que “não há nenhum sinal de recessão no radar”.
Por aqui, seguimos firmes com Hash5 e principalmente com o Bitcoin, afinal, 1 BTC = 1 BTC.