O financiamento dos projetos abertos de blockchain e criptomoedas ainda é uma questão a ser resolvida.
Por exemplo, já comentei em textos anteriores a dificuldade de se garantir uma fonte de renda contínua no mundo open-source. Inclusive, até hoje a forma mais usada de sustento das instituições ligadas às criptomoedas é separar uma (grande) quantidade de moedas na criação do blockchain e esperar que a valorização do cripto-ativo seja suficiente para manter as engrenagens rodando. Obviamente isto não é sustentável, afinal, as moedas são finitas e os preços não sobem para sempre.
Outro problema que se enfrenta no ecossistema das criptomoedas é decidir quais projetos devem receber financiamento e de qual valor. Se em uma sociedade centralizada como a nossa, os membros do executivo e legislativo já brigam para decidir o orçamento da União, imagine o que pode acontecer em um setor que defende descentralização acima de tudo?
A opinião dos entusiastas das criptomoedas é bem clara: tanto poder na mão de alguns seria totalmente contrário à filosofia do sistema, criaria suspeitas e minaria o valor dos projetos no longo prazo. Pelo que observamos no Brasil, é difícil dizer que eles estão errados…
No entanto, quem trabalha para melhorar as criptomoedas precisa sobreviver e ter condições de realizar suas funções. Neste sentido, ideias interessantes vêm sendo testadas na plataforma de desenvolvedores Gitcoin, fortemente ligada à rede Ethereum.
Uma abordagem interessante feita por esta plataforma é a utilização de um método chamado quadratic funding, usado para determinar como os recursos disponíveis serão divididos. Basicamente, para cada USD 1,00 que alguém doa para um projeto, um fundo deposita outro USD 1,00. Porém, a razão entre o valor financiado por pessoas e pelo fundo segue uma lógica quadrática (x²). Assim, se uma mesma pessoa der 4 USD, somente 2 USD serão aplicados pelo fundo. Com isso, busca-se:
- Permitir que as pessoas possam dizer o quanto valorizam algo, o que não é possível nos sistemas tradicionais de votação. Por exemplo, ao oferecer USD 50,00 para uma proposta, o doador mostra que considera este projeto mais relevante do que ofertando USD 1,00.
- Impedir que o sistema seja controlado por algumas pessoas com muito recursos: o total de arrecadado por um projeto pode a ser maior se muitas pessoas mostrarem engajamento do que se poucos doarem muito.
- Demandar skin in the game (palavra da moda para “ter o seu na reta”), pois cada indivíduo precisa investir seu próprio dinheiro para ter direito a opinar.
Na quinta etapa de financiamento (a mais recentemente), o fundo disponível era USD 250.000 para investimento em áreas como tecnologia, mídia e uma sessão especial para projetos que ajudem a combater os efeitos do COVID-19 e auxiliar na retomada econômica pós-pandemia. O maior valor recebido por uma única iniciativa foi de pouco mais de USD 21.000 a partir de 85 contribuições. Estes valores não chegam a impressionar, mas é bom ressaltar que muitas das pessoas que foram beneficiadas trabalhavam de graça até então.
Além disso, o Gitcoin vem sendo aperfeiçoado a cada nova concorrência e o tamanho, ainda pequeno, acaba servindo de proteção enquanto os processos não estão maduros. Na última rodada, por exemplo, notou-se um aumento no nível de conluio, com gente pedindo abertamente contribuições nas redes sociais e prometendo doar o mesmo valor em retribuição. Por isso, para o futuro, está sendo estudada a possibilidade de tornar as doações secretas, inibindo este tipo de atitude em larga escala.
Algumas questões ainda estão sem solução, como garantir que cada conta online seja referente a somente uma pessoa. Mas de qualquer forma, as cinco rodadas que ocorreram até o momento mostram que pode existir alternativas para o financiamento de projetos abertos que não envolvam a centralização da rede e que sejam sustentáveis a longo prazo.